segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Produtos de uso cotidiano podem oferecer riscos à saúde

Tatiana Mendonça


PERIGO! VIVER MATA! Dado o aviso, brusco, porém necessário, vamos às letrinhas miúdas. Sabe quais são os efeitos de todas aquelas substâncias químicas que aparecem na composição da pasta de dente que você usa todo santo dia? E no xampu, hidratante, protetor solar, desodorante? Se sua resposta for um sonoro não, fique tranquilo, você não está só. Nem os pesquisadores sabem exatamente como nosso corpo vai responder, a longo prazo, ao uso contínuo e combinado dessas coisinhas todas.

O professor Eduardo Silva, do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Biomonitoramento da Universidade Federal da Bahia, lembra que existem no mundo de 80 mil a 90 mil substâncias licenciadas. E, como você é capaz de imaginar, nenhuma delas se desinventa, não é? Ficam por aí no ar que a gente respira, na água que a gente bebe, nos produtos que a gente passa no corpo, nos alimentos e objetos que a gente consome.

Isso está parecendo conversa daquele seu amigo hippie? Vamos admitir, talvez ele tenha lá suas razões. "Nossa preocupação é muito grande para agroquímicos e metais pesados, mas eles não representam, quantitativamente, o maior número de substâncias a que estamos expostos. É um desvio de foco". E volta a citar números, para dimensionar a questão.

Aproximadamente mil pesticidas são licenciados, contra cerca de oito mil cosméticos e cerca de três mil conservantes para alimentos, fora os 70 mil "e tantos" produtos químicos utilizados nas indústrias.
E algumas coisinhas são bem pequenas mesmo, como as nanopartículas, presentes em milhares de produtos. "Elas têm propriedades totalmente diferentes das substâncias originais e também percorrem um outro caminho nas nossas células. Nós ainda não sabemos que caminho é esse". Este ano, os Estados Unidos, baniram o uso do triclosan, antibactericida comum em sabonetes e pastas de dente. Os possíveis efeitos vão desde alterações hormonais até o crescimento de células cancerígenas.

É dose

Mas, calma, não criemos pânico! O pesquisador José Antônio Menezes Filho, coordenador do Laboratório de Toxicologia da Faculdade de Farmácia da Ufba, acalma mentes e corações com uma máxima do famoso alquimista Paracelso: "Toda substância pode ser tóxica. O que diferencia o remédio do veneno é a dose".
Trocando em miúdos, o que interessa não é tanto a substância, mas a quantidade, a frequência e a duração dessa exposição. Em tese, os produtos que estão no mercado são seguros, porque passam por testes dos fabricantes e agências reguladoras. Alguns desses testes são controversos, porque são realizados com animais. "Eles diluem, por exemplo, uma gota de xampu e pingam no olho do coelho, para ver se causa alguma irritação. É cruel, mas ao mesmo tempo é uma tentativa de proteger o usuário".

Outro problema é que esses testes medem reações a curto e a médio prazo. "Com o uso contínuo de algumas substâncias é que aparecem os efeitos a longo prazo. E aí, eventualmente, algumas delas são retiradas ou alteradas na formulação". Lembra daquele antisséptico que ardia um bocado quando em contato com machucados diversos de quem estava de traquinagem? Pois, o Merthiolate mudou de fórmula justamente porque seu princípio ativo era o tiomersal, um composto orgânico do mercúrio, que é tóxico. "O curioso é que as vacinas no Brasil até hoje são conservadas com mercúrio. E aí o recém-nascido faz todo aquele programa de vacinação... Cada gotinha daquela tem uma quantidade de mercúrio. Isso sem contar o que ele já absorveu da mãe".

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que segue recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e que "as empresas detentoras de registro já estão desenvolvendo novas formulações sem conservantes", seguindo indicação da própria OMS. No Ministério do Meio Ambiente, o entendimento é outro. Documento do Grupo de Trabalho sobre Mercúrio afirma que este "pode produzir uma gama de efeitos adversos à saúde humana, incluindo danos permanentes no sistema nervoso, afetando principalmente o seu desenvolvimento, além de ser transferido da mãe para o feto durante toda a gestação. Em face de todos esses efeitos adversos, bebês, crianças e mulheres em idade fértil são considerados populações vulneráveis".

Se oriente

Aí mesmo na sua casa você mantém outros hábitos perigosos, como o uso da naftalina, aquelas bolinhas que servem para conversar as roupas ou afastar traças e baratas. "A Vigilância Sanitária e a Organização Mundial da Saúde já alertaram para o risco toxicológico de câncer dessa substância. Mas, ainda assim, ela continua à venda nos mercados, e as pessoas manipulam aquilo. Criança, então, põe até na boca", diz José Antônio.

E no trabalho, você pega aquele copinho de plástico para tomar café sem pestanejar? Vale pensar melhor. É que eles são feitos de PVC, o policloreto de vinila, que é "extremamente hepatotóxico", ou seja, pode causar lesões no fígado. "E uma exposição de longo prazo pode causar câncer". O uso adequado do produto - leia-se não esquentar tomando aquele cafezinho ­- minimiza os efeitos.

Ainda no setor "plásticos", é preciso estar atento para a presença de bisfenol A em vasilhas que usamos para guardar e aquecer alimentos. Ele também é usado para revestir enlatados, evitando que se oxidem. Desde 2011, a Anvisa proibiu o uso da substância em mamadeiras, baseando-se em estudos "que apontam riscos decorrentes da exposição", mas não alterou a permissão do componente nas embalagens para alimentos, por entender que, "até o momento, não há justificativa para a adoção de outras restrições".
Os dados sobre os danos provocados pelo bisfenol A podem até não ser conclusivos, mas os indícios não param de se acumular. Muitas pesquisas mostram como a substância provoca mudanças hormonais e interfere, por exemplo, no desenvolvimento dos ovários. Em testes com animais, ratas que receberam doses de BPA pararam de produzir óvulos viáveis precocemente. Se a paranoia bater, troque os vasilhames plásticos por recipientes de vidro, ou procure produtos livres de BPA.

A boa notícia nisso tudo é que a convivência compulsória com um mundo de substâncias químicas fez com que nosso corpo evoluísse, fazendo com que sejam, ao menos em parte, eliminadas. É a desintoxicação. "Cada insulto que a gente recebe, o organismo tem formas de metabolizar. O perigo é que o insulto ocorra de modo continuado e a regeneração seja sobrepujada, gerando mutações nas células".

Detox

Na nutrição, os processos de destoxificação ficaram famosos com as dietas detox. Elas tentam equilibrar certa falta de noção dos dias atuais: a gente se expõe a muitas toxinas e não consome as vitaminas, minerais e compostos bioativos necessários para esse processo acontecer de forma eficiente, como explica a nutricionista Mônica Menezes. "Isso gera um congestionamento. Os órgãos mais prejudicados são o fígado, o intestino e o rim".

Radical, Mônica cortou de vez o consumo de carne, leite e queijo e tem horror a embutidos. "Eles são carnes de qualidade inferior disfarçadas com corantes e conservantes químicos, como o nitrito e o nitrato, altamente cancerígenos. E não me venha com essa história de blanquet de peru. Tirou o mínimo de gordura ali, como se esse fosse o maior problema, mas continua cheio de toxina. É lixo do mesmo jeito".
Para ela, as dietas detox devem ser permanentes. É preciso acostumar-se a consumir diariamente folhas verdes (como rúcula), cítricos (limão e laranja) e alho cru (misturado com azeite de oliva para fazer um molhinho de saladas). "A gente precisa de comida de verdade. Quanto menos processado e mais fresco e colorido, melhor".

Mônica também recomenda o consumo de orgânicos. Não custa lembrar, o Brasil é campeão mundial em uso de agrotóxico. Por ano, cada brasileiro ingere cerca de cinco litros de veneno vindos de variados pesticidas, alguns deles proibidos em outros países do mundo. Assustou? "Não é para ficar neurótico. É ter ciência para fazer determinadas escolhas. Diminuir dentro do possível o consumo de substâncias tóxicas e dar melhor condição para o corpo colocar toxinas para fora".

Fonte: http://atarde.uol.com.br/

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